quarta-feira, 30 de julho de 2008

O prazer escorrega pelas mãos

Ninguém está pronto, nada está pronto. Tudo é um perpétuo fazer-se.
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E até o vento, que vive arrepiando toda essa gente, está arrepiado com toda essa coisa.
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E a velhinha, percebendo a tristeza da neta, perguntou se ela não via mais passarinho verde. Num sorriso singelo, que não convence ninguém, respondeu que via, mas que ele gostava de outras gaiolas.

terça-feira, 22 de julho de 2008

Todo dia ele diz tudo sempre igual:

P: Ainda é cedo filha
F: Começou... (bocejo.)
P: Mal começaste a conhecer a vida
F: ... ("quase 50 anos de praia", né?!)
P: Já anuncias a hora da partida
F: ... (que drama!)
P: Sem saber mesmo o rumo que irás tomar
F: ... (Como assim?! Ah! "esse rumo te levará para debaixo da ponte!")
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P: Preste atenção filhinha
F: Eu presto... (e em dois sentidos...)
P: Embora saiba que estás resolvida
F: ... (Sim, estou.)
P: Em cada esquina cai um pouco a tua vida
F: Vou anotar essa pro seu livro de frases.
P: Em pouco tempo não serás mais o que és
F: Você não disse que sabe que estou resolvida?!
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P: Ouça-me bem filha
F: ... (Lálálá... não tô ouvindo, não tô ouvindo!)
P: Preste atenção, o mundo é um moinho
F: ... (Ual! uma metáfora! inédito!)
P: Vai triturar teus sonhos tão mesquinhos
F: Mesquinho... (é o caralho!)
P: Vai reduzir as ilusões à pó.
F: ... (Um dia mostro que você está errado!)
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P: Preste atenção filhinha
F: Não, cansei. Vou pra casa...
P: De cada sonho tu herdarás só o cinismo
F: Você me prometeu que não tocaria mais nesse assunto...
P: Quando notares estás a beira do abismo
F: Ei, já te disse: quanto mais você insiste, mais tenho vontade de te contrariar!
P: Abismo que cavaste com teus pés
F: Nunca te vi tão poético... Vou embora, tchau.
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Referências Bibliográficas: O Mundo É Um Moinho - Cartola
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ps. cansei de passarinhos.

domingo, 20 de julho de 2008

O início é o fim

Trecho do conto Estória do ladrão e do papagaio retirado de Luuanda - José Luandino Vieira

Pode mesmo a gente saber, com a certeza, como é um caso começou, porquê, pra quê, quem? Saber mesmo o que estava se passar no coração da pessoa que faz, que procura, desfaz ou estraga as conversas, as macas? Ou tudo que passa na vida não pode-se-lhe agarrar no princípio, quando chega nesse princípio vê afinal esse mesmo princípio era também o fim doutro princípio e então, se agente segue assim, para trás ou para a frente, vê que não pode se partir o fio da vida, mesmo que está podre nalgum lado, ele sempre se emenda noutro sítio, cresce, desvia, foge, avança, curva, aparece... E digo isto, tenho minha razão. As pessoas falam, as gentes que estão nas conversas, que sofrem os casos e as macas contam, e logo ali, ali mesmo, nessa hora em que passa qualquer confusão, cada qual fala a sua verdade e se continuam falar e discutir, a verdade começa a dar fruta, no fim é mesmo uma quinda de verdades e uma quinda de mentiras, que a mentira é já uma hora da verdade ou o contrário mesmo.

Garrido Kam’tuta veio na esquadra porque roubou um papagaio. É verdade mesmo. Mas saber ainda o princípio, o meio, o fim dessa verdade, como é então? Num papagaio nada que se come; um papagaio fala um dono, não pode se vender; um papagaio come muita jinguba e muito milho, um pobre coitado capianguista não gasta o dinheiro que arranja com um bicho assim, não dá lucro. Porquê então roubar ainda um pássaro desses?

O fio da vida mostra o quê, o como das conversas, mesmo que está podre não parte. Puxando-lhe, emendando-lhe, sempre a gente encontra um princípio num sítio qualquer, mesmo que esse princípio é o fim doutro princípio. Os pensamentos, na cabeça das pessoas, têm ainda de começar em qualquer parte, qualquer dia, qualquer caso. Só o que precisa é procurar saber.

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Quero falar do amor, mas não sei quando principiou. Em março? (talvez perto da páscoa: ah... renasci! ou talvez do outono: ah... morri.)

sexta-feira, 11 de julho de 2008

Tão bonito.

Chover (ou Invocação para um dia Líquido) - Cordel do Fogo Encantado, composição: Lirinha e Clayton Barros.
"O sabiá no sertão
Quando canta me comove
Passa três meses cantando
E sem cantar passa nove
Porque tem a obrigação
De só cantar quando chove"

quinta-feira, 10 de julho de 2008

É

Poeminha do Contra - Mário Quintana
Todos estes que aí estão
Atravancando o meu caminho,
Eles passarão.
Eu passarinho!

quarta-feira, 9 de julho de 2008

Mais passarinhos

Toada do Amor - Carlos Drummond de Andrade
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E o amor sempre nessa toada!
briga perdoa perdoa briga.
Não se deve xingar a vida,
a gente vive, depois esquece.
Só o amor volta para brigar,
para perdoar,
amor cachorro bandido trem.
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Mas, se não fosse ele, também
que graça que a vida tinha?
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Mariquita, dá cá o pito,
no teu pito está o infinito.

segunda-feira, 7 de julho de 2008

O mês é dos passarinhos

PASSAREDO - Chico Buarque e Francis Hime
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Ei, pintassilgo
Oi, pintaroxo
Melro, uirapuru
Ai, chega-e-vira
Engole-vento
Saíra, inhambu
Foge asa-branca
Vai, patativa
Tordo, tuju, tuim
Xô, tié-sangue
Xô, tié-fogo
Xô, rouxinol sem fim
Some, coleiro
Anda, trigueiro
Te esconde colibri
Voa, macuco
Voa, viúva
Utiariti
Bico calado
Toma cuidado
Que o homem vem aí
O homem vem aí
O homem vem aí
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Ei, quero-quero
Oi, tico-tico
Anum, pardal, chapim
Xô, cotovia
Xô, ave-fria
Xô, pescador-martim
Some, rolinha
Anda, andorinha
Te esconde, bem-te-vi
Voa, bicudo
Voa, sanhaço
Vai, juriti
Bico calado
Muito cuidado
Que o homem vem aí
O homem vem aí
O homem vem aí

sexta-feira, 4 de julho de 2008

O limite maior é doce - e/ou - Porque não era livre

PARDALZINHO - Manuel Bandeira (1943)
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O pardalzinho nasceu
Livre. Quebraram-lhe a asa.
Sacha lhe deu uma casa,
Água, comida e carinhos.
Foram cuidados em vão:
A casa era uma prisão,
O pardalzinho morreu.
O corpo Sacha enterrou
No jardim; a alma, essa voou
Para o céu dos passarinhos!
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quinta-feira, 3 de julho de 2008

A andorinha?

Certa vez um milho dentro de uma embalagem de pipoca se metamorfoseou berrando: piPOCa. O grito foi tão alto que explodiu o microondas.